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A ternura dos 30...

Os bobos

Conta o Leitor

2014-08-28 às 06h00

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SUSANA MIRANDA

Nasci no ano de 1984, depois de nove meses de espera para vir ao mundo. Precisamente hoje completo trinta anos de idade... Um momento de viragem, em que deixo de ser a menina mais nova da casa, abandono a fase da adolescência, juventude e passo para a independência, para a chamada vida adulta.

É inevitável não me sentir nostálgica, deprimida e desmotivada, porque o passado, o presente e o futuro assolam os meus pensamentos e pressionam-me como nunca antes tinha sentido. Quando tinha oito anos e andava na escola primária, pensava que nesta fase da minha vida já estaria estabilizada, com uma casa, marido e... filhos, quem sabe?! Hoje, a realidade é bem diferente e todas as expectativas que criamos em crianças, muitas vezes, acabam por sair defraudadas.

O meu jantar de aniversário está a ser preparado pela minha mãe... Penso que vai fazer uma carne estufada com arroz e salada. Compete-me a mim ir à pastelaria e escolher um bolo de aniversário, o suficiente para saciar a gula de cinco pessoas... Sim, somos cinco à mesa: os meus pais, sempre presentes, a minha irmã, de trinta anos, o meu cunhado e a minha sobrinha que, este ano, ainda não come uma fatia de bolo connosco, já que tem apenas cinco mesinhos.
Durante o dia muitas pessoas foram ligando e escrevendo... As tias do costume com a pergunta da praxe: “quando casas?”; as amigas de faculdade sempre a perguntar pelo ainda não descoberto “príncipe encantado”; a madrinha sempre com bons conselhos para dar tempo ao tempo; a irmã a combinar o jantar de logo e sem tocar nos assuntos indelicados do coração... A realidade é mesmo esta: cheguei aos trinta, solteira, tia e com o coração livre para amar, depois de uma relação duradoura, mas que acabou por não resultar. Entrei num período de “pousio” há alguns anos e, desde então, assim fiquei. No entanto, é muito difícil para os mais tradicionalistas compreenderam que eu posso optar por ficar sozinha, por nunca ter um companheiro de vida, ou a dita vida “normal” de casados. Sempre que me cruzo com alguém o tema do casamento, do marido, do homem, dos filhos têm que vir sempre à conversa, ao ponto de me apetecer tatuar na braço “solteira e boa rapariga”, porque nem todas temos que casar e ter filhos nesta altura da vida.

A independência foi uma das coisas novas e maravilhosas nesta fase da vida. Depois de dezasseis anos de escola e faculdade, entrar no mundo do trabalho, ganhar o primeiro salário, comprar aquela bolsa que vi na montra e adorei, sem ter que pedir a mesada adiantada ao meu pai, é das melhores sensações de emancipação e liberdade... Tal como o facto de poder sonhar em comprar uma viagem a Londres ou simplesmente passar um fim-de-semana num hotel à beira mar, coisas que antes, enquanto estudava, não estavam ao meu alcance com tanta facilidade. Contudo, agora que tudo isto é possível com um simples ordenado no final do mês, falta-me a vontade e a companhia para querer acordar longe da casa dos pais. Financeiramente sou independente, é um facto, mas ainda não consegui libertar as amarras e alugar um apartamento só meu, chegar a casa e não ter ninguém à minha espera e cozinhar apenas para mim. Cheguei à idade adulta, porém ainda me falta abraçar a vida adulta!

Os trinta anos de idade fizeram-me também perceber que pareço a única mulher solteira e sem compromissos matrimoniais assumidos na minha zona. De repente, todas as minhas amigas e colegas de trabalho são casadas, têm pelo menos um filho, ou vivem juntas. Os temas de conversa passam sempre pelo estado de saúde dos filhos, pela disposição matinal do marido e pelo fim-de-semana em família na casa da sogra. Ah! Os fins-de-semana... Aqueles que toda a gente anseia e espera desde a segunda-feira, desde o início da semana de trabalho... são os momentos perfeitos para me sentir sozinha e a única mulher nestas condições à face da terra. Tenho sempre duas hipóteses que passam, ou por fazer a festa do pijama durante esses dois dias de descanso, ou por me arranjar com um lindo vestido e umas sandálias e ir passear na minha própria companhia. Quando isso acontece, no meu carro começo a reparar que, em todos os outros, vão famílias ou casais de namorados que aproveitam o domingo para namorar e dar liberdade a todos os desejos oprimidos. Se decido parar numa pastelaria para lanchar, todas as mesas estão ocupadas por, pelo menos duas pessoas, mulher e homem, que fazem o mesmo que eu, mas num programa a dois. E que tal uma ida ao cinema? Pois bem, sou sempre o único ser humano sozinho numa matine de domingo! O melhor do fim-de-semana é, sem dúvida, poder estar sossegada com a minha família, colocar a conversa em dia com a minha irmã e brincar com a minha pequena sobrinha. Mudam-se as idades e mudam-se as vontades... Lá se foi o tempo das discotecas, das noitadas e das caipirinhas! Nada melhor do que dormir até mais tarde e esquecer o despertador às sete e vinte da manhã! O melhor da segunda-feira é verificar que tudo volta ao “normal”, que todos os carros vão apenas com o condutor ao volante, tal como eu, e que na pastelaria todos os clientes tomam o pequeno almoço sozinhos, tal como eu também.

De regresso ao meu jantar de aniversário, eis que chegou a hora do brinde e de partir o bolo. O meu único desejo é o mesmo de sempre: ser feliz, mesmo aos trinta!

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